Capa do Álbum: Antena 1
A Rádio Online mais ouvida do Brasil
Antena 1

Mortos em operação em favelas do Rio não estavam entre denunciados pelo MP

Mortos em operação em favelas do Rio não estavam entre denunciados pelo MP

Reuters

10/11/2025

Placeholder - loading - Pessoa obsera de trás de um carro queimado durante operação policial na favela da Penha, no Rio de Janeiro 28/10/2025 REUTERS/Aline Massuca
Pessoa obsera de trás de um carro queimado durante operação policial na favela da Penha, no Rio de Janeiro 28/10/2025 REUTERS/Aline Massuca

Por Ricardo Brito, Luciana Magalhães e Fabio Teixeira

RIO DE JANEIRO, 10 Nov (Reuters) - O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), elogiou a recente operação policial nos complexos de favelas do Alemão e da Penha, a mais mortal da história do Brasil, como um sucesso, mas nenhuma das 117 pessoas mortas pela polícia estava entre os 69 suspeitos citados pelos promotores na denúncia que serviu de base para a operação.

Apenas cinco das pessoas citadas na queixa criminal foram presas naquele dia e nenhuma delas era líder graduado da facção criminosa Comando Vermelho, de acordo com uma análise da Reuters do relatório completo da polícia sobre a operação compartilhado com o Supremo Tribunal Federal (STF).

A ação policial nos complexos de favelas localizados na zona norte da capital fluminense, conhecida como Operação Contenção, deixou 121 pessoas mortas, incluindo quatro policiais e dois adolescentes, e 99 suspeitos foram levados sob custódia.

A operação também não conseguiu prender ou matar figuras importantes do Comando Vermelho, que, segundo os investigadores, tem quartel-general nas favelas invadidas pela polícia. O principal líder da quadrilha, Edgar Alves de Andrade, conhecido como Doca, continua foragido.

Um líder de médio escalão da quadrilha foi detido sem que um tiro fosse disparado, de acordo com o relatório da polícia, analisado com exclusividade pela Reuters.

As descobertas desafiam a versão oficial da operação, realizada em duas favelas densamente povoadas. Após a operação, os moradores locais alinharam dezenas de cadáveres nas ruas.

A operação, que ocorreu uma semana antes de os líderes mundiais começarem a chegar para a cúpula climática das Nações Unidas COP30, em Belém, colocou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que a chamou de 'desastrosa', contra os conservadores que dizem que ela é um modelo de combate ao crime organizado.

Enquanto o governo de Lula apoiou as operações policiais destinadas a interromper o financiamento do crime organizado, rivais à direita, como Castro, defendem incursões agressivas para apreender armas e prender ou matar membros de facções, apesar do alto custo humano.

O secretário de Segurança Pública do Estado do Rio, Victor dos Santos, confirmou à Reuters que o objetivo do governo na operação era prender os homens que haviam sido acusados pelo Ministério Público estadual. Mas, acrescentou, 'não foi muito fácil procurar 69 pessoas entre as 280.000' que vivem nas favelas que foram alvo da operação.

Embora 19 dos homens mortos não tivessem registro criminal anterior, de acordo com os documentos da investigação, Santos disse que tinha 100% de certeza de que eram criminosos.

Ele argumentou que o número de pessoas mortas e presas mostrou que 'o quadro é muito pior do que o que a investigação mostrou'. Ele disse que outras incursões estão planejadas para os próximos meses nas favelas do Rio.

Ainda assim, os resultados iniciais da operação alimentaram as críticas das famílias das vítimas, bem como dos defensores dos direitos humanos, de que a polícia matou indiscriminadamente em vez de perseguir objetivos claros com base em investigações de longa data sobre o Comando Vermelho, uma das maiores e mais violentas facções criminosas do Brasil.

A polícia 'os prende, executa e está bom, porque sabem que não tem lei', disse Samuel Peçanha, cujo filho Michel, de 14 anos, foi morto durante a operação policial. 'Mas isso no Brasil é uma coisa normal.'

Embora Peçanha tenha dito que seu filho Michel, um dos adolescentes mortos, fazia parte da facção, ele ainda tinha esperanças de convencê-lo a seguir um caminho diferente.

'Ele ainda era uma criança', disse ele. 'Infelizmente, eu não consegui retirar ele (de lá).'

'EU SÓ QUERO QUE ISSO ACABE'

Tauã Brito, 36 anos, disse que estava esperando angustiada há horas por uma resposta de seu filho de 20 anos, Wellington, quando decidiu sair de casa e ir procurá-lo.

Wellington, membro da facção, disse a ela que estava escondido na área de mata acima da favela, enquanto a polícia fazia buscas no bairro. Em uma de suas últimas mensagens para ela, analisada pela Reuters, ele disse que planejava limpar seu nome: 'Só quero que tudo isso acabe logo'.

Ela caminhou pela mata no meio da noite usando seu celular para iluminar o caminho. 'Devo ter visto cerca de 50 corpos', disse ela. 'Encontrei meu filho por volta da 1h30 da manhã.'

Wellington, segundo sua mãe, foi baleado na cabeça e esfaqueado no braço.

Brito estava entre as muitas mães e outros moradores que se aventuraram durante a noite e voltaram com dezenas de corpos que depois foram alinhados em uma rua movimentada onde os moradores fazem compras e as crianças jogam futebol.

O corpo de Yago Ravel, de 19 anos, estava sem cabeça, de acordo com registros públicos e um vídeo analisado pela Reuters.

Outros tinham ferimentos a facadas, segundo os moradores.

Santos, o secretário de segurança pública, disse que os ferimentos horríveis foram provavelmente infligidos por membros da facção, acrescentando que a análise preliminar mostrou que o homem decapitado já estava morto quando sua cabeça foi cortada.

'A probabilidade é de ter sido o próprio criminoso para criar essa cena de barbárie', disse.

A polícia diz que os moradores comprometeram a cena do crime, dificultando a investigação do que aconteceu na área de mata atrás da favela. Nenhuma equipe forense foi chamada para analisar a cena posteriormente, disse Santos.

Beatriz Nolasco, tia de Yago Ravel, disse que não acredita que a família possa descobrir o que aconteceu com seu sobrinho.

'Nunca conseguiremos aceitar como ele foi morto, com a cabeça arrancada e colocada em uma árvore', disse ela.

O Brasil registrou 44.127 mortes violentas intencionais em 2024, uma queda de 5,4% em relação ao ano anterior, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Em 2024, 6.243 pessoas foram mortas pela polícia, uma média de 17 mortes por dia.

Santos argumentou que, na operação envolvendo 2.500 policiais, 'o monopólio da força ficou demonstrado que é do Estado'.

Os críticos afirmam que a operação não reduzirá a violência das facções que assola a cidade do Rio há décadas.

'Momentaneamente, desconstrói algum grupo armado, algum movimento ligado ao tráfico, mas isso não acaba', disse Pedro Carriello, defensor público que auxilia familiares dos mortos. 'Fica a perda das famílias.'

Embora uma pesquisa nacional da AtlasIntel publicada na sexta-feira tenha mostrado que 55% dos brasileiros apoiaram a operação policial, os familiares das vítimas disseram que a polícia não fez seu trabalho.

'A polícia podia ter prendido meu filho', disse Brito, mãe de Wellington. 'Mas não tinha o direito de matá-lo'.

(Reportagem de Ricardo Brito, em Brasília, e Luciana Magalhães e Fabio Teixeira, no Rio de Janeiro; Reportagem adicional de Rodrigo Viga Gaier, no Rio de Janeiro)

Reuters

Compartilhar matéria

Mais lidas da semana

 

Carregando, aguarde...

Este site usa cookies para garantir que você tenha a melhor experiência.