Pauta conservadora dividirá atenção com econômica no Congresso, diz aliada de Bolsonaro cotada para presidir CCJ
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Por Ricardo Brito e Anthony Boadle
BRASíLIA (Reuters) - Uma das principais aliadas do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), a deputada federal eleita Bia Kicis (PRP-DF) acredita que a pauta conservadora e de segurança pública vai dividir as atenções do trabalho no Congresso com a agenda econômica no início do mandato do próximo governo.
'É preciso que essas pautas sejam levadas a sério e logo no início (do governo). Acho que as pautas de costume não podem esperar porque o Jair foi eleito por causa delas', disse Bia Kicis, em entrevista exclusiva à Reuters na segunda-feira, ao reconhecer que não levar isso a cabo poderá gerar frustração entre apoiadores dele.
'O eleitor de Bolsonaro espera isso e nós como parlamentares eleitos por estarmos com a nossa imagem vinculada à do Bolsonaro, acho que, por isso, nós temos uma responsabilidade (de levar adiante essas pautas)', completou.
Bia Kicis é uma das futuras congressistas mais próximas a Bolsonaro, que conheceu quatro anos atrás quando ambos atuavam na Câmara de pautas conservadoras como de defesa da família. Ela esteve por trás, por exemplo, de toda a operação que aproximou no ano passado o à época pré-candidato a presidente e o economista Paulo Guedes, futuro homem forte da economia. Foi uma das raras convidadas presentes na casa dele a assistir a vitória de Bolsonaro no último dia 28.
Procuradora aposentada do Ministério Público do Distrito Federal, a deputada federal eleita já se coloca publicamente como candidata a presidir a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara em 2019, a mais importante da Casa e por onde passam as principais proposições legislativas, como reformas que alteram a Constituição.
Bia Kicis defendeu que, no próximo ano, a Câmara vote propostas que tipifique como crime de terrorismo a invasão de propriedades privadas feitas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), o chamado excludente de ilicitude, pela redução da maioridade penal para 16 anos ('já com muito atraso'), a proibição das saídas temporárias de presos, popularmente conhecidas como 'saidões', a adoção de regras mais rígidas para a progressão de regime de cumprimento de pena e a possibilidade de revogação do Estatuto do Desarmamento.
Ainda assim, paralelamente à agenda de costumes, a futura parlamentar disse que é preciso o governo Bolsonaro se empenhar em tentar aprovar logo no Congresso uma agenda econômica e citou a reforma da Previdência como uma das prioridades. Ela admite que essa proposta é impopular e que será necessário fazer um 'mix' sobre as pautas a serem votadas no Congresso.
'É preciso que as pessoas entendam que neste momento estamos à beira do precipício. Basta ver a equipe que ele está montando, um 'dream team'', disse.
'Obviamente que todo mundo vai ter que passar por um sacrifício, porque a crise é gigantesca. Nós temos 14 milhões de desempregados e todo mundo vai ter que contribuir um pouco só que muito menor o sacrifício que nós teríamos se nós continuássemos rumo ao precipício e virássemos uma Venezuela, que era o caminho natural. Se o Bolsonaro não fosse eleito, o Brasil viraria uma Venezuela', afirmou.
SUPREMO
A deputada federal eleita também cobrou a aprovação da chamada lei da Escola Sem Partido, projeto que proíbe professores a abordar temas políticos em sala de aula e que foi idealizado inicialmente pelo advogado Miguel Nagib, seu cunhado.
Bia Kicis aproveitou essa discussão para disparar críticas ao Supremo Tribunal Federal (STF) ao fato de que ainda neste mês a corte deverá, em sua opinião, declarar inconstitucional uma lei estadual nessa mesma linha. O STF já suspendeu liminarmente duas leis de Estados e municípios com esse teor.
'A Escola Sem Partido, aquelas pessoas que são contra querem ganhar no tapetão. Hoje o Supremo abraçou essa missão de derrubar a Escola Sem Partido', afirmou.
Para a parlamentar eleita, o Supremo e parte da imprensa precisam compreender que as eleições mostraram uma virada no país.
'Espero que eles entendam que não dá para ficar brincando com a vida das pessoas, não da para continuar esquecendo a lei, a Constituição e vivendo de acordo com a ideologia e a consciência deles. Eles não estão lá para isso, não são legisladores, são juristas, os ministros são os guardiões da Constituição e é isso que a população espera deles', disse.
'Estou esperando que eles enxerguem isso e que passem a atuar de acordo com a função deles, porque está ficando feio', acrescentou.
Bia Kicis disse defender 'muito' o parlamento e que pautas de costumes, que nunca passariam no Congresso, partidos de esquerda querem ganhar no 'grito' e no 'tapetão' recorrendo em alguns casos ao Supremo. Ela exemplificou o fato de o Congresso não querer altera a legislação referente à liberalização do aborto --só permitido em casos específicos-- é uma sinalização, no momento em que o STF pode revisar o entendimento sobre o assunto.
'Deixa do jeito que está, o Código (Penal) de 1940 resolveu uma pacificação. Não tem que mexer nem ampliar nem para dificultar o aborto', disse ela, ao protestar. 'É o ativismo judicial violando a vontade do povo, a separação dos Poderes', completou.
CONGRESSO
A deputada federal eleita afirmou que o PSL, o partido de Bolsonaro, vai se tornar a maior bancada da Câmara com as migrações de parlamentares de legendas que não atingiram a chamada cláusula de barreira --norma que impede ou restringe o funcionamento parlamentar ao partido que não atingir um percentual de votos. O PSL elegeu 52 deputados, 4 a menos que o PT. Segundo ela, deve chegar a 60. Ela própria vai deixar o PRP para engordar a bancada do PSL.
Mesmo assim, Bia Kicis é a favor de que outro partido que não o PSL presida a Câmara, conforme defendeu recentemente Bolsonaro, como forma de garantir uma maior base de apoio para aprovar as reformas. Ela citou como candidato ao cargo o deputado reeleito pelo PRB João Campos (GO), evangélico e integrante da bancada da segurança pública, e disse que vê com reservas a reeleição de Rodrigo Maia (DEM-RS) para o posto, ao citar que ele sempre contou com o apoio da esquerda e impediu o avanço de pautas conservadoras.
A futura parlamentar acredita, com o apoio declarado de importantes frentes parlamentares e de alguns partidos, que Bolsonaro terá ao menos 300 deputados em sua base aliada, deixando isolado o PT que, a seu juízo, estão fragilizados e serão uma 'minoria barulhenta' no Congresso.
Na entrevista, Bia Kicis chegou a afirmar que Bolsonaro se elegeu com uma 'missão divina' e que, não fosse assim, ele estaria morto após a facada que foi alvo em ato de campanha no início de setembro.
'Ele não é uma pessoa que vai chegar para fazer molecagem, vim para mudar e vou fazer igual. Não existe essa possibilidade', disse. 'Bolsonaro prefere perder, sair sem fazer o sucessor, do que se sujar. Ele não vai se sujar. Eu não tenho medo de me decepcionar com Bolsonaro', acrescentou.
Escrito por Thomson Reuters
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